DIREITO AOS CRÉDITOS DAS CONTRIBUIÇÕES PIS/COFINS SOBRE CUSTOS E DESPESAS INCORRIDOS NO TRANSPORTE DE MERCADORIAS COM FROTA PRÓPRIA – ANÁLISE DO TEMA SOB ENFOQUE DA ANALOGIA, DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA E DE OUTROS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS | Zanquetta Vitorino Advogados Associados

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16/12/2011 10h22

DIREITO AOS CRÉDITOS DAS CONTRIBUIÇÕES PIS/COFINS SOBRE CUSTOS E DESPESAS INCORRIDOS NO TRANSPORTE DE MERCADORIAS COM FROTA PRÓPRIA – ANÁLISE DO TEMA SOB ENFOQUE DA ANALOGIA, DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA E DE OUTROS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

I – SITUAÇÃO SOB EXAME

Contribuinte A das contribuições sociais PIS e COFINS, sujeito ao regime não cumulativo de apuração e recolhimento desses tributos, fabricante do produto Y, não possui veículos próprios para o transporte e entrega desse seu produto até os estabelecimentos comerciais, atacadistas ou varejistas, que o adquirem para revenda ao consumidor final. Por isso, para colocação de seu produto nos recintos dos referidos estabelecimentos, esse contribuinte A contrata serviços de transporte prestados por terceiros, suportando as correspondentes despesas com fretes.

No âmbito da sistemática legal de apuração e recolhimento das contribuições PIS/COFINS não cumulativas, esse contribuinte A, naturalmente, incorre em custos e despesas de fabricação de seu produto Y, que lhe propiciam créditos dedutíveis dos débitos dessas mesmas contribuições. E, na ultimação do ciclo de produção e comercialização, também vem a incorrer em despesas de frete com a contratação do transporte terceirizado de seu produto, as quais, igualmente, lhe geram créditos.

De acordo com as normas da legislação das contribuições do PIS e da COFINS não cumulativas, em termos de créditos oponíveis aos débitos das contribuições PIS/COFINS, não há dúvida quanto a que o contribuinte A, fabricante do produto Y, pode calculá-los sobre os valores dos custos e despesas da fase produtiva, numa etapa do processo de produção e comercialização que antecede à da entrega do produto a seus adquirentes (comerciantes atacadistas ou varejistas). E pode mais, pode calcular créditos sobre os valores dos fretes pagos para o transporte de seu produto Y.

Não paira a menor dúvida quanto ao direito a esses créditos do PIS e da COFINS pelo contribuinte contratante de serviços de transporte, em face do estatuído no art. 3.º, IX, e art. 15, II, da Lei n.º 10.833/2003:

“Art. 3.º Do valor apurado na forma do art. 2.º a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:

(…)

IX – armazenamento de mercadoria e frete na operação de venda, nos casos dos incisos I e II, quando o ônus for suportado pelo vendedor.

Art. 15. Aplica-se à contribuição para o PIS/PASEP não-cumulativa de que trata a Lei n.º 10.637, de 30 de dezembro de 2002, o disposto:

(…)

II – nos incisos VI, VII e IX do caput e nos §§ 1.º e 10 a 20 do art. 3.º desta Lei;”

Consideremos, agora, a situação de outro contribuinte, B, fabricante do mesmo produto Y, com custos e despesas de produção idênticas aos do contribuinte A. Entre um e outro, a única diferença está em que B, do ponto de vista da logística, possui frota de transporte própria para a entrega do produto Y aos seus adquirentes, ao passo que o contribuinte A, como se viu, contrata terceiros para o transporte de seu produto, mediante pagamento de frete.

Por conseguinte, há perfeita identidade econômico-empresarial no que diz respeito às atividades operacionais das empresas dos contribuintes A e B. Ambas fabricam um mesmo produto e estão sujeitas a um mesmo regime de incidência das contribuições PIS e COFINS, não cumulativo, que lhes propicia créditos em relação aos custos/despesas e receitas incorridas e auferidas com a produção e comercialização do produto Y.

Daí e de tanto há que se concluir que, estando em perfeita igualdade de condições no desenvolvimento de suas atividades empresariais, os contribuintes A e B devem suportar a mesma carga tributária, relativamente às não cumulativas contribuições PIS e COFINS, para a entrega de sua produção aos clientes? Ou, mais especificamente, as despesas com o transporte dos produtos devem originar créditos tanto para o contribuinte A, que contrata terceiros para transportá-los, quanto para o contribuinte B, que realiza ele próprio o transporte de seus produtos?

A Receita Federal vem entendendo que não, que, por falta de previsão legal, e não podendo ser definidos como insumos, os custos e despesas com transporte próprio não dão ao contribuinte direito ao desconto de créditos das contribuições PIS e COFINS. Pelo menos, este tem sido o tom das soluções de consultas de contribuintes dadas pela RFB, como a de n.º 19, de 11.01.2010, da Divisão de Tributação da 8.ª Região Fiscal.

Concordamos com que a disposição legal do art. 3.º, IX, e a do art. 15, II, da Lei n.º 10.833/2003, efetivamente, só fazem referência a despesas com frete. Não obstante, vamos sustentar que esse dispositivo de lei não pode ser interpretado de forma isolada, apartada de todo o complexo sistema jurídico-tributário engendrado pelo legislador tributário para a implantação da incidência não cumulativa das contribuições PIS e COFINS.

II – A ANALOGIA

O Código Tributário Nacional, nos seus artigos 107 a 112, contém regras de interpretação das leis tributárias. E, já na primeira delas (art. 108, I), elege a analogia como critério de elucidação do verdadeiro alcance e sentido da norma tributária, quando ausente disposição legal expressa a respeito da matéria examinada.

Diferentemente do que sucede em relação à equidade, também umas das regras de interpretação adotadas pelo art. 108 do CTN, não está dito que o emprego da analogia não poderá implicar dispensa de pagamento de tributo indevido (§ 1.º). Bem ao contrário, está é explicitado que da utilização da analogia não poderá resultar exigência de tributo não previsto em lei (2.º).

Daí se infere que, como regra de interpretação, a analogia poderá ser aplicada em favor do contribuinte, porém, nunca contra, se daí resultar exigência de tributo que não tenha previsão legal. Isto é, de sua utilização como regra auxiliar de interpretação da legislação tributária, se admite que a carga fiscal do contribuinte possa ser minorada, mas não agravada, para a exigência de tributo ilegal.

A fim de se evitar indesejadas discriminações na aplicação do Direito Tributário e, com isso, dentro de um sistema de arrecadação de tributos complexo como esse das contribuições PIS/COFINS não cumulativas, buscar-se a harmonia entre a literalidade da lei e sua mens legis, o uso da interpretação analógica sempre terá lugar. Como, com toda sua autoridade, anotou Ricardo Lobo Torres:

“O princípio da tipicidade não implica total fechamento da norma, capaz de excluir a analogia. No direito tributário aparecem com freqüência os conceitos indeterminados, as cláusulas gerais e os tipos, que, sendo lacunosos por definição, abrem-se para a colmatação pela analogia.” (A Proibição da Analogia no Direito Tributário, in Revista de Informação Legislativa (25) 100, out/dez. 1988).

Ora, a discriminação entre os contribuintes do nosso exemplo ficará mais do que evidenciada, caso venha a prevalecer o entendimento fiscal de que aquele que contrata serviço de transporte de seus produtos pode apropriar créditos sobre os fretes, enquanto que o que transporta ele mesmo seus produtos não terá direito a qualquer crédito sobre os custos e despesas nesse transporte.

Isto não pode ser. Se, como quer o fisco, custos e despesas de transporte não geram direito a crédito algum, após o término do ciclo de produção, exceto nos casos de contratação de serviço de transporte junto a terceiros, então é preciso achar-se uma solução jurídico-tributária que compatibilize o tratamento tributário sob a óptica dos créditos fiscais de PIS e COFINS.

Só quem está completamente alheio à realidade dos fatores econômicos que comandam as relações comerciais entre contribuintes (de direito) de tributos e consumidores de produtos (contribuintes de fato), para não se dar conta de que há atividades em que não é viável, não é possível, a realização de transporte por empresas do ramo.

Há inúmeras situações em que a utilização de veículos próprios vem a se tornar um imperativo. Mencione-se o exemplo dos frigoríficos de carne. Em suas atividades de produção e posterior comercialização de seus produtos, eles só podem se valer de frota própria de veículos, dotada de equipamentos de refrigeração indispensáveis à conservação desses produtos alimentícios. Não lhes sobra a alternativa de contratar serviço de transporte, para poderem usufruir dos créditos de PIS e COFINS que poderiam calcular sobre os fretes pagos.

No entanto, também as empresas do ramo frigorífico incorrem em custos e despesas de transporte. São custos e despesas (combustíveis, lubrificantes, reparos, peças, etc.) visceralmente vinculados a essa atividade, o transporte de mercadorias, sem a qual produtos e mercadorias não chegariam a seu destino. Assim, uma mesma atividade — a de transporte — proporciona direito a créditos numa situação, na do transporte efetuado por terceiros, mas não os admite na outra situação, na atividade do transporte com frota própria.

Mais um exemplo: O dos fabricantes de outros produtos alimentícios altamente perecíveis. Entre os quais podemos citar os fabricantes de pães, bolos e biscoitos industriais. Estes também não têm escolha. São obrigados a se organizar, logisticamente, de modo a fazer com que seus produtos cheguem o mais rápido e cedo possível aos supermercados, padarias, bares e restaurantes.

Não custa esclarecer, ou lembrar, que, nesses exemplos dos frigoríficos e dos fabricantes de pães industriais, para cumprimento de obrigação acessória quanto à emissão de documentos fiscais, estes têm que emitir nota fiscal geral para acobertar a saída da totalidade dos produtos. Depois, à medida que esses produtos vão sendo entregues, em cada estabelecimento adquirente, notas fiscais individuais são emitidas, cujo somatório, no final da entrega tem que fechar com a nota fiscal geral, ou exigir a emissão de notas fiscais de entrada para os produtos não entregues.

Como se vê, até no adimplemento dessas obrigações fiscais acessórias, relacionadas ao transporte de produtos, fica patenteado que há contribuintes (frigoríficos e fabricantes de pães, entre outros) que têm de cumpri-las por si mesmos, sem poder contar com serviços de terceiros.

De sorte que temos atividades empresariais onde a manutenção de frota própria para o transporte de produtos e mercadorias até seus adquirentes é de vital importância para a ultimação dos negócios da empresa. Nestas, sem transporte próprio, os fins empresariais não seriam atingidos a contento, daí ser essencial e imprescindível que tais empresários contem com veículos seus para o transporte de seus produtos.

Todos esses elementos de percepção e valoração jurídico-tributária das situações em que sem encontram os contribuintes A e B do nosso exemplo levam o intérprete a buscar uma saída que impeça essa disparidade e discriminação de tratamento, entre um e outro, em matéria de créditos das contribuições PIS e COFINS. Se, na atividade de transporte, nessa matéria, a letra da lei (art. 3.º, IX, e art. 15, II, da Lei 10.833/03) contempla apenas aquela que implica pagamento de frete, se faz necessário procurar um meio de preencher essa lacuna,

A analogia é o meio mais frequente de preenchimento de lacunas. Ela corresponde à transposição de uma regra, já posta na lei, para outra hipótese não especificamente regulada em lei. Não é preciso que haja perfeita identidade entre as hipóteses analisadas, basta que haja ponderável semelhança. É novamente Ricardo Lobo Torres que nos indica os parâmetros para a analogia:

“A analogia no Direito Tributário deve observar alguns parâmetros importantes: só se utiliza quando insuficiente a expressividade das palavras da lei: é necessário que haja semelhançanotável entre o caso emergente e a hipótese escolhida para a comparação.” (Normas de Interpretação e Integração no Direito Tributário, p. 120)

 

A jurisprudência de nossos tribunais tem prestigiado a utilização do recurso interpretativo da analogia no Direito Tributário, consoante pode ser constatado, a título ilustrativo, na seguinte ementa do acórdão proferido pela 2.ª Turma do TRF da 4.ª Região, parcialmente transcrita (AC 5518 PR 2008.70.02.005518-4):

TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. PRECLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE. ADUANEIRO. IMPORTAÇÃO/EXPORTAÇÃO FICTÍCIA. RESPONSABILIDADE. SÓCIO-GERENTE. LEGITIMIDADE. EXISTÊNCIA. PENA DE PERDIMENTO. MERCADORIA IMPORTADA. NÃO LOCALIZAÇÃO. PENA PECUNIÁRIA. CONVERSÃO. POSSIBILIDADE. ANALOGIA. NECESSIDADE.

(…)

.5 – Constatada a mácula na exportação e a prestação de falsa informação em documento imprescindível ao êxito do procedimento, impõe-se a aplicação da pena de perdimento ao responsável. Inteligência do disposto no artigo 105, inciso VI, do Decreto-Lei  n.º 37 /66.6 – É lícita a conversão da pena de perdimento em pena pecuniária quando perecido ou não encontrado o objeto da exportação. Quando o fato ocorre depois da edição da medida Provisória nº 66/2002, que alterou o disposto nos §§ 1.º e 3.º do artigo 23 do Decreto-Lei nº 1.455/76, com arrimo nessa legislação aplica-se a sanção. Quando anterior, o julgador há de integrar a lacuna do ordenamento, observando – nessa ordem – a analogia, os princípios gerais de direito tributário, os princípios gerais de direito público e a equidade, tal qual preceitua o artigo 108 do CTN, porquanto especial em relação ao artigo 4.º da LICC.7 – A ausência de regramento específico para o caso e a existência de previsão da conversão da pena de perdimento e pena pecuniária para situação similar, no Regulamento Aduaneiro, autoriza o uso da analogia como fator integrativo da lacuna, mormente quando não se está debatendo a exigência de tributo ou aplicação de anistia ou a outorga de isenção  CTN 108 e 111).  (grifado)

Em suma, se a norma sobre desconto de créditos das contribuições PIS/COFINS inserta no art. 3.º, IX, e art. 15, II, da Lei n.º 10.833/2003 se mostra lacunosa, no que respeita ao aproveitamento de créditos das despesas de transporte, que não o frete, incorridas pelo contribuinte que dispõe de frota própria de veículos, o emprego da analogia resolve satisfatoriamente tal lacuna. Relativamente a custos e despesas com o transporte de produtos e mercadorias, se não há identidade, há muita semelhança e equivalência entre o contribuinte que transporta seus próprios produtos até o destino e o que o faz valendo-se de transporte terceirizado.

Ainda sob o prisma dos sobreditos dispositivos legais pode-se invocar o princípio constitucional da isonomia, a bem de que a aplicação do art. 3.º, IX, e art. 15, II, da Lei n.º 10.833/2003 seja estendida ao transporte próprio. Há equivalência nas duas situações aqui tratadas, não sendo razoável que despesas e custos da mesma natureza tenham tratamentos tributários díspares e desencontrados, apenas porque uma situação gera despesas de frete, enquanto, a outra, despesas ou custos com combustíveis, lubrificantes, partes e peças consumidas pela frota própria.

Todavia, esse e outros princípios constitucionais serão examinados no tópico seguinte, que trata dos insumos. No entanto, tudo o que for dito nesta segunda parte deste trabalho, referente à isonomia, vale para o tópico da analogia que acabamos de encerrar.

III – A ISONOMIA E A CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Prosseguimos no estudo aqui proposto, voltando-nos, agora, para outro ângulo da questão. Sustentaremos que os custos e despesas com combustíveis, lubrificantes e peças de manutenção dos veículos componentes de frota de transporte própria, embora a opinião contrária da RFB, constituem insumos para fins de apropriação de créditos das contribuições PIS e COFINS.

Através de várias Soluções de Consulta a RFB vem reiterando seu entendimento no sentido de que somente podem ser considerados insumos, para fins da quantificação das contribuições PIS e COFINS, através da contraposição de créditos e débitos, bens e serviços que, adquiridos pelo contribuinte, se agreguem aos produtos por ele fabricados ou comercializados, ou aos serviços por ele prestados. É, sem tirar nem por, o conceito de há muito utilizado pelas legislações do IPI e do ICMS para a determinação do quantum debeatur desses velhos e conhecidos impostos.

Efetivamente, a RFB tem dito sempre que, no caso de aquisição de bens e serviços, para que estes possam ser qualificados como insumos, é necessário que sejam consumidos ou sofram desgaste, dano ou perda de propriedades físicas ou químicas em função da ação diretamente exercida sobre o serviço que está sendo prestado ou sobre o bem ou produto que está sendo fabricado.

A maioria dos contribuintes do PIS e da COFINS jamais se conformou com essa visão fiscal, fiscalista e demasiadamente limitada do conceito de insumo, sempre que se trata de apropriação de créditos dedutíveis dessas contribuições. Desse inconformismo surgiram incontáveis consultas feitas por contribuintes à RFB, bem como múltiplas discussões judiciais em torno dessa questão e diversas impugnações administrativas a autuações fiscais levadas, em grau de recurso, ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF.

No princípio, e até bem pouco tempo atrás, eram constantes e reiterados os reveses sofridos pelos contribuintes nessa disputa administrativa e judicial no tocante à compreensão jurídico-tributária do conceito de insumo. Porém, presentemente, começam a obter pronunciamentos favoráveis aos contribuintes os questionamentos judiciais e administrativos acerca do conceito de insumo no âmbito das contribuições PIS/COFINS.

Deveras, o conceito de insumo está ganhando nova conotação jurídica, para efeito de reconhecimento do direito aos créditos das contribuições PIS/COFINS, que lhe amplia o significado, afastando-o daquela concepção rígida, restritiva e limitadora, que lhe querem dar as autoridades fazendárias.

Tem-se visto, atualmente, que, depois de anos e anos de lutas e questionamentos dos contribuintes, estes obtiveram importantes precedentes administrativos e judiciais que vêm desvinculando das legislações do IPI e do ICMS o conceito de insumo para efeito de apropriação de créditos das contribuições PIS e COFINS.

Essa nova concepção jurisprudencial do conceito de insumo, assim como a observância do princípio constitucional da isonomia, em matéria de reconhecimento de créditos do PIS e da COFINS, são fundamentais para a conclusão que se pretende extrair do presente estudo, qual seja, a de que proporcionam direito a créditos das mencionadas contribuições as despesas e gastos com combustíveis, lubrificantes, reparo de veículos, peças etc., efetuados pelo contribuinte para manutenção de frota própria de transporte de seus produtos.

Entre os precedentes administrativos que deram outra dimensão à palavra insumo há, por exemplo, aquele firmado no julgamento do processo administrativo n.º 11020.001952/2006-22, realizado em 8 de dezembro de 2010, ocasião em que a 3.ª Seção da 2.ª Câmara da 2.ª Turma Ordinária do Conselho Administrativo de Recurso Fiscais – CARF, em votação unânime, decidiu que o conceito de insumo deve ser aquele dado pela legislação do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ:

“REGIME NÃO CUMULATIVO. INSUMOS. MATERIAIS PARA MANUTENÇÃO DE MÁQUINAS

O conceito de insumos dentro da sistemática de apuração de créditos pela não cumulatividade de PIS e Cofins deve ser entendido como todo e qualquer custo ou despesa necessária à atividade da empresa, nos termos da legislação do IRPJ, não devendo ser utilizado o conceito trazido pela legislação do IPI, uma vez que a materialidade de tal tributo é distinta da materialidade das contribuições em apreço.”

Judicialmente, o Egrégio Tribunal Regional da 4.ª Região, em decisão unânime de sua Colenda Primeira Turma, já teve o ensejo de concluir pela absoluta impropriedade de se equiparar o regime da não cumulatividade das contribuições PIS e COFINS com o regime da não cumulatvidade do IPI e do ICMS. Isso ficou bem claro já na ementa do Acórdão exarado na Apelação Cível n.º 0029040-40.2008.404.7100/RS, aqui reproduzida em parte:
TRIBUTÁRIO. PIS. COFINS. LEIS Nº 10.637/2002 E 10.833/2003, ART. 3º, INCISO II. NÃO CUMULATIVIDADE. AUSÊNCIA DE PARALELO COM O IPI. CREDITAMENTO DE INSUMOS. SERVIÇOS DE LOGÍSTICA DE ARMAZENAGEM, EXPEDIÇÃO DE PRODUTOS E CONTROLE DE ESTOQUES. ILEGALIDADE DAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS SRF Nº 247/2002 E 404/2004. CRITÉRIO DE CUSTOS E DESPESAS OPERACIONAIS.

 (…)

7. As despesas com serviços de armazenagem, expedição de produtos e controle de estoques, enquadram-se no conceito de insumos, uma vez que são necessárias e indispensáveis para o funcionamento da cadeia produtiva. (grifado)

Logo, na concepção atual, o conceito de insumo, em termos de PIS/COFINS, pouco ou nada tem a ver com aquele que se infere das legislações do IPI/ICMS. É conceito com conotação e significado próprios, que o aproxima do conceito de custo de aquisição e de despesas operacionais prevalecente na legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas.

De fato, retomando a situação específica dos contribuintes A e B, examinada neste trabalho, é fora de dúvida de que ambos, visto como se dedicam à mesma atividade empresarial, suportam, no item insumo, os mesmos custos e despesas de produção, até a etapa final da colocação do produto no comércio, que só pode ser atingida com o transporte deste aos seus adquirentes.

As despesas com o transporte do produto, seja este realizado em frota de veículos própria, ou por transportadora de terceiros, são necessárias e indispensáveis à atividade da empresa tanto para o contribuinte A quanto para o contribuinte B.

Na verdade, foi apenas circunstancial a colocação, pelo articulista, dessa hipótese de contribuintes fabricantes de um mesmo produto. Com essa situação hipotética, quis-se deixar bem frisado o quão absurda é a posição restritiva adotada pela RFB em relação aos créditos das contribuições PIS e COFINS sobre despesas com o transporte de produtos efetuado com veículos próprios.

Convém relembrar, então, que o entendimento da RFB, nessa questão, é o seguinte: As despesas com o transporte de produto, até o estabelecimento de quem o adquiriu, geram, para o estabelecimento vendedor (industrial ou comercial), créditos de PIS e COFINS, calculados sobre o valor do frete pago. Já as despesas com esse mesmo transporte (combustíveis e lubrificantes, peças, etc.), se realizado com veículos de propriedade do estabelecimento vendedor, não dão direito a qualquer crédito.

Quer dizer: No cumprimento da última etapa do ciclo produtivo, o contribuinte que mantém frota própria para o transporte de seu produto não pode calcular e apropriar créditos de PIS/COFINS sobre as respectivas despesas, direito esse assegurado ao contribuinte que se vale de transporte alheio.

Tal distinção é injurídica, e, por isso, injustificável. É uma injuridicidade que chega ao plano constitucional ante o mandamento do art. 150, II, da Constituição Federal, segundo o qual não deve haver tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente.

Trata-se do conhecido princípio da igualdade de todos perante a lei, que, conquanto já previsto no art. 5.º, caput, da CF/88, entre os direitos e garantias fundamentais, ganhou norma específica no Sistema Tributário Nacional. Ficou assim evidenciado que o Poder Constituinte não quis que pairasse qualquer resquício de dúvida quanto ao tratamento fiscal isonômico que deve ser observado pelo legislador infraconstitucional em matéria de tributos.

Com efeito, são claros os termos do art. 150, II, da Constituição, no sentido de que, aos contribuintes que se encontrem em situação equivalente, deve ser dado o mesmo tratamento jurídico-tributário, sob pena de ofensa ao princípio constitucional dessa isonomia específica. O que deve, no entanto, ser entendido por situação equivalente?

Comentando o art. 150, II, da CF/88, em artigo intitulado “A Cumulatividade das Contribuições PIS/Pasep/Cofins e a Desigualdade de Tratamento entre seus Contribuintes” (RDDT 63/7), Aroldo Gomes de Mattos disse ser

“Desnecessário, pois, que os contribuintes se encontrem em situações exatamente iguais. Basta serem parecidas, equiparadas ou similares para exigirem tratamento tributário uniforme.”

Na situação aqui exemplificada, há total igualdade entre os contribuintes A e B, fabricantes de um mesmíssimo produto industrial. E a situação seria no mínimo equivalente em relação a um terceiro contribuinte, C, sujeito, também, ao regime não cumulativo das contribuições PIS e COFINS, que contratasse empresa de transporte para a entrega de seu produto.

Essa igualdade e equivalência residem, primeiro, no fato inconteste de que os três contribuintes (A, B e C) estão submetidos a idêntico regime legal de incidência das contribuições PIS e COFINS. Eles não escolheram livremente tal regime; estão inseridos nele por imposição das leis n.ºs 10.637/2002 e 10.833/2003, que instituíram e disciplinaram

a não cumulatividade das contribuições PIS e COFINS, por meio da adoção do sistema de confronto entre débitos e créditos para apuração dos respectivos valores.

Portanto, ditos contribuintes, além de praticarem o mesmo fato gerador dessas contribuições sociais, estão obrigados a observarem o mesmo sistema jurídico-tributário de apuração destas, estando, assim, adstritos a cumprirem idênticas obrigações principais e acessórias para cálculo e recolhimento dos valores devidos a título das contribuições PIS e COFINS.

Incorrem em custos e despesas de produção e de colocação do produto à disposição dos clientes, que afetam e influenciam, de forma igual ou equivalente para eles, o montante do tributo a pagar, após a consideração desses custos e despesas. Significa dizer que esses contribuintes (A, B e C) estão envolvidos num plexo da cadeia produtiva que os coloca em situação igual, ou, pelo menos, equivalente, no que diz respeito aos aspectos qualitativos e quantitativos do fato gerador da obrigação tributária de pagar as contribuições PIS e COFINS pela sistemática da não cumulatividade.

Ora, contribuintes que participam de um mesmo fato imponível estão, no mínimo, na situação de equivalência aludida no texto constitucional. Para cumprimento das respectivas obrigações tributárias tem relevância todos os elementos econômicos relacionados com o fato gerador, como, em se tratando das contribuições PIS/COFINS, todos os custos e despesas compreendidos nesse conceito mais amplo de insumo, agora adotado pelo CARF (processo n.º 11020.001952/29006-22), qual seja, o de que deve ser entendido como tal “todo e qualquer custo ou despesa necessária à atividade da empresa, nos termos da legislação do IRPJ.”

Nem a verificação desses custos e despesas, para fins de PIS/COFINS, deve se cingir às fases ou ciclos produtivos propriamente ditos, devendo ser levadas em conta “até mesmo as (fases) posteriores, desde que seja imprescindível para o funcionamento do fator de produção”, como bem já definiu o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região no julgamento da Apelação Cível n.º 40.2008.404.7100/RS.

Sendo assim, a igualdade ou equivalência que requer a aplicação do princípio constitucional da isonomia contemplado no art. 150, II, da CF, há que ser medida e avaliada, em âmbito tributário, com foco no fato gerador (fato imponível) do tributo em relação ao qual a observância do princípio isonômico é postulada.

Se o fato imponível for, por exemplo, a importação de produto, os importadores estão em situação de equivalência entre si, tendo relevância para satisfação das correspondentes obrigações tributárias apenas o fato econômico da operação de importação em si mesma considerada. Aliás, para ilustração desse exemplo (importação) é oportuno mencionar que o Plenário do STF entendeu que, na importação de mercadorias, a averiguação de eventual quebra do princípio da isonomia entre contribuintes deve ficar circunscrita a própria operação de importação.

A questão examinada pelo STF, no RE n.º 195.663-1, foi a da exigência de antecipação de ICMS, ainda que o estabelecimento importador acusasse saldo credor em sua escrita fiscal. Alegou-se ofensa ao princípio da isonomia com esse tratamento tributário (recolhimento antecipado de ICMS), em relação ao tratamento dispensado aos contribuintes não importadores. No voto condutor do acórdão, o Ministro Marco Aurélio destacou:

“O que veda o inciso II do artigo 150 da Constituição Federal é a instituição de tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente. No caso, este último dado deve ser perquerido tendo em conta os contribuintes que importam e os que não importam. No caso, a desigualdade exsurge do tratamento desigual relativamente a pessoas que se encontram em situações diversas.”

Como se vê, o não reconhecimento do direito a crédito das contribuições PIS e COFINS aos contribuintes que se utilizam de meio de transporte próprio para colocar seu produto à disposição de seus clientes viola o princípio constitucional da isonomia sob o prisma e perspectiva com que esse princípio já foi analisado e aplicado pelo STF. No citado RE 195.663-1, o STF deixou de aplicar o princípio porque os contribuintes não estavam em situação equivalente, na medida em que a comparação pretendida era com quem (não era importador de mercadoria) não praticava o mesmo fato gerador do ICMS, que era a importação de mercadoria.

Demais disso, essa recalcitrância do Fisco quanto ao reconhecimento de créditos do PIS/COFINS sobre custos e despesas com o transporte de produtos em frota do próprio contribuinte vai de encontro ao princípio da razoabilidade. Apesar da fluidez e da aparente indeterminação que cercam a compreensão desse princípio, entendemos ser possível afirmar-se que, na questão sob exame, a razoabilidade há que ser aferida com base na equidade, ou seja, na lição de Humberto Ávila, com um olhar sobre a primeira acepção com a qual esse princípio deve ser visto.

Efetivamente, o tratamento tributário entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente deve primar pela equanimidade. Deve ser buscada, pelo intérprete da lei tributária, a harmonização da norma geral com os casos individuais. A razoabilidade impõe o respeito a dois aspectos, a saber: Primeiro, a interpretação das normas deve ser feita com a presunção daquilo que normalmente ocorre, que se mostra razoável; segundo a int

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